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com a cabeça entre as orelhas

com a cabeça entre as orelhas

16
Dez20

Parece uma banheira futurista.

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Parece uma banheira futurista. Com luzes e tudo. Com tampa e tudo. Com música ambiente e tudo. Com botões que controlam o tudo daquilo.

A água salgada facilita o processo. É impossível não flutuar.

Parece simples e 40 minutos não são muitos minutos... até passarem a ser.

Perdi a roupa e o peso. Deitada num morno tapete salgado, decidi aproveitar o tempo para meditar. 

Fechei a tampa. Era só uma tampa. 

Apaguei as luzes. Eram só umas luzes.

Desliguei a música. Eram só uns sons.

Passada a claustrofobia inicial percebi a tranquilidade da privação sensorial. A ausência. Talvez apenas o batimento cardíaco ao fundo do ouvido direito. O sussurro da respiração.

Sabe bem conseguir não fazer nada por uns minutos a não ser existir. Sem luz. Sem som. Sem peso(s).

03
Mai20

Um dia disseram-me “Queixas-te muito”.

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Um dia disseram-me “Queixas-te muito”.

Nesse dia eu fiquei a pensar... e depois esqueci.

Em média, segundo Will Bowen, uma pessoa queixa-se entre 15 a 30 vezes por dia sem que se dê conta.

A G.R.I.P.E., diferente da doença, é uma doença em si só e pretende nomear as possíveis razões:

Get attention - algum narcisismo disfarçado na queixa

Remove responsibility - as condições raramente são as ideais

Inspire envy - vulgo “gabarolas”

Power - juntando queixosos todos ganham força

Excuse poor performance - nunca é culpa nossa o que correu mal; já se tinha visto que as condições eram terríveis (vide R.)

Pensamentos não são queixas. Só pensamentos.

Nomear factos (erros) a quem os pode, efectivamente, corrigir não são queixas. Só factos.

O resto são queixas.

Um dia disseram-me “Queixas-te muito”. 

Eu fiquei a pensar... e agora acho que vale a pena tentar o desafio “21-day no-complaint”. 

 

 

01
Mai20

Maio.

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Maio. Levanta o véu da possibilidade. Tem promessa de mar.

Ou Maio de outro ano qualquer; que em breve o passado é o mesmo e visto de cima os dias esbatem-se uns nos outros.

À distância suficiente tudo é pequeno. 

 

What a night! What bliss is all about!

I thank my native north country!

From the kingdom of ice and snow,

How fresh and clean May flies in!

- Afanasy Fet

(Epígrafe da partitura de Tchaikovsky para o mês de Maio - White Nights!)

10
Abr20

Fato de circulação. Touca. Viseira. Máscara P2...

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Fato de circulação. Touca. Viseira. Máscara P2. Protector de calçado. 1º par de luvas. Bata. 2º par de luvas.

O covidário é um espaço hermético onde o silêncio e o som se misturam numa cacofonia de coisa nenhuma. Somos todos iguais com o equipamento de protecção. Somos todos iguais como sempre fomos, que a pandemia veio reforçar a essência humana.

O covidário pediátrico tem por trás o som das vozes e do choro de crianças.

No meio do desconforto pareceu-me ouvir ópera, mas havia tanto ainda a fazer. Tudo no ritmo lentificado de teclados cobertos com película aderente e movimentos tolhidos pelo equipamento e pelo receio de falhar algum passo de desinfecção.

Pareceu-me, novamente, ouvir ópera por entre o choro. Mais do que ouvir senti  nas entranhas que era a música da minha existência. Estava novamente na Gulbenkian. E a Prima Donna... não pude deixar de sorrir.

Levantei-me e fui ter com a mãe da criança que aguardava mais exames e perguntei-lhe “Está a ouvir ópera?”, o telefone pousado no banco vazio ao lado. Perguntei-lhe se era música. Disse-me que não e explicou-me que nunca teve oportunidade de ir à ópera, que adora. Que a voz da Callas a arrepia e tranquiliza em momentos como aquele. Fez jeito de desligar o telefone feito aparelhagem. Disse-lhe que se deixasse estar a ouvir. Vi-lhe o sorriso na curva do olhar, que agora as bocas andam tapadas.

Nestes momentos somos (mais)  humanos.

24
Mar20

Entre uma voz conhecida e uma serena...

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Entre uma voz conhecida e uma serena, reencontrei a minha.

Andei perdida até decidir refazer os passos da minha calma e voltar ao Estoicismo. Saber a diferença entre o que se pode ou não controlar. 

  • Meditação
  • Filosofia
  • Gratidão

As previsões catastróficas deixo-as de parte. Não controlo o resultado. Controlo ficar em casa.

 

"I may wish to be free from torture, but if the time comes for me to endure it, I'll wish to bear it courageously with bravery and honor. Wouldn't I prefer not to fall into war? But if war does befall me, I'll wish to carry nobly the wounds, starvation, and other necessities of war. Neither am I so crazy as to desire illness, but if I must suffer illness, I'll wish to do nothing rash or dishonorable. The point is not to wish for these adversities, but for the virtue that makes adversities bearable.”

Seneca, Moral Letters, 67.4

 

 

04
Mar20

Há várias situações ansiogénicas na vida.

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Há várias situações ansiogénicas na vida. Há ainda mais situações ansiogénicas na vida de quem sofre de ansiedade.

O minimalismo permitiu-me interromper o ciclo da exaustão, da imagem literal de burn out na vela que se apaga por ter esgotado o pavio. Acredito não seja para todos. Sei que não é para todos (prova aqui). Talvez seja procurado por quem mais necessita; talvez seja o ponto de convergência dos ansiosos e/ou obsessivos. Quem sabe?

A mim permitiu-me, em efeito dominó, o seguinte:

  • Reduzir a sensação de necessidade
  • Entender o trabalho excessivo, motivado pela falsa sensação de escassez, como desnecessário
  • Mais tempo de qualidade
  • Mais clareza mental dentro e fora do trabalho
  • Poupar
  • Reduzir o ruído de uma casa cheia 

Há várias situações ansiogénicas na vida. A mudança de casa pode ser considerada uma delas. Sem dúvida que, na fase actual, o minimalismo iniciado há 1 ano me facilita o processo. (Um armário de sala coube em 2 caixas.)

01
Mar20

Vendi por um abraço.

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Vendi por um abraço.

Mais uma etapa de OLX para me libertar de excessos. A mudança de casa estava já facilitada com a limpeza do ano anterior, mas há sempre mais qualquer coisa que não faz falta.

Depois das combinações difíceis para o encontro que permitiria a venda da mochila em questão, a senhora disse-me que tencionava fazer os caminhos de Santiago com os sobrinhos e que não queria gastar muito dinheiro em material. 

A ideia dos caminhos de Santiago atrai-me tanto quanto me assusta. Admiro quem os faz e saber que seria feito em família foi o quanto bastou para que entregasse a mochila a troco de nada. A troco de nada não. Vendi por um abraço. O mais apertado de há muito; oferecido por uma estranha.

16
Fev20

Todas as mulheres que amei.

Recostei-me no lugar habitual. O azul do céu do fim de dia emoldurava o verde das copas das árvores. Da zona do palco conhecido, vazio, chegavam alguns sons repetidos, em jeito de aquecimento.

Trouxeste contigo outra tonalidade de azul - densa; concreta. E essa outra moldura abraçava a pele dos ombros que eu despi lentamente ao som de mil pássaros em vôo.

Há tantos anos atrás a música havia parado. Naquele instante, com a tua chegada, reiniciaste o compasso.

04
Jan20

Hoje é um dia que o meu pai não viu.

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Hoje é um dia que o meu pai não viu. Não viu este dia nos últimos 13 anos. Vou assinalando mentalmente os anos que ficaram por fazer, as vidas que ficaram por viver.

Hoje, no dia que seria de festa, a festa aconteceu. Na possibilidade, na mudança. 

Hoje perguntaram-me quantas pessoas morreram às minhas mãos. Creio que, às minhas mãos literalmente, apenas uma. O pai que sobrou do pai quando o pai desapareceu. O meu avô. 

Nada é o que era como quando todos estavam vivos e se festejavam aniversários. Mas a vida acontece e, no processo, está a felicidade. Não mais à frente, no talvez imaginado; não lá atrás, numa remota lembrança do que não é mais. A felicidade acontece agora, quando conseguimos a gratidão daquilo que nos é oferecido, ainda que nem sempre pedido ou desejado.

 

 

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